O grupo responsável pelo Piauí Cap foi alvo este mês de uma operação da Polícia Federal denominada Trevo, desencadeada em 13 estados e centralizada em Pernambuco. Ele atuava em atividades que se estendiam desde a prática do jogo do bicho e máquinas caça-níqueis até a emissão de bilhetes de loteria, travestidos como títulos de capitalização. É o caso do Piauí Cap.
A empresa de sorteios de prêmios possui cinco sócios-proprietários. Cada um com 25% na divisão do controle societário. São os bicheiros Gustavo Coutinho Paschoal, Julio Emilio Cavalcanti Paschoal Neto, Hermes Coutinho Paschoal e Claudio da Rocha Paschoal Filho. Todos eles eram comandados por Christiano Rocco Carneiro, dono da Ativa, e que operava o esquema, segundo a Polícia Federal. O capital social da empresa, com sede na avenida Frei Serafim, onde foi cumprido mandado de busca e apreensão, é de R$ 100 mil. Como principal atividade, o Piauí Cap informava que oferecia “serviços de propaganda e publicidade” e não a comercialização de títulos de capitalização.
Documentos de posse do 180 informam que o grupo também atuava no ramo da administração e intermediação de negócios, de máquinas, imobiliário e ainda de comunicação e publicidade. Seus sócios são donos da Paschoal Administração e Intermediação de Negócios LTDA EPP, em Maceio, Alagoas; da Paschoal Serviços Lotéricos LTDA, em Belo Horizonte, Minas Gerais – onde também a PF atuou; e da Sistema Recifense de Máquinas LTDA EPP, da Goiás Administração e Intermediação de Negócios LTDA EPP, da Paschoal Imobiliária LTDA e da E2 Comunicação e Publicidade LTDA ME, todas localizadas em Recife, Pernambuco.
Cerca de 300 policiais participaram da operação Trevo, uma das maiores operações da Polícia Federal em termo de efetivo. Os trabalhos da PF contaram com o apoio da Secretaria de Defesa Social de Pernambuco, da Superintendência de Seguros Privados e da Receita Federal. Segundo os investigadores, “a organização criminosa operava por meio de loterias estaduais cujos valores arrecadados eram repassados a entidades filantrópicas de fachada, fazendo com que o dinheiro ilícito retornasse ao grupo, em um procedimento suspeito, com fortes indícios de lavagem de dinheiro”.
LAR DA ESPERAÇA DEVERIA TER RECEBIDO R$ 1,8 MILHÃO
Ainda segundo a PF, “o tronco principal da Organização registrou uma movimentação financeira ilegal estimada em bilhões de reais e atuava, tanto no jogo do bicho, como na comercialização de bilhetes lotéricos travestidos de títulos de capitalização em sua modalidade popular, apropriando-se dos valores que deveriam ser destinados a instituições beneficentes ou revestidos em capitalização, obtendo vantagem ilícita em detrimento do povo”.
Entre as instituições a serem beneficiadas estava o Lar da Esperança, em Teresina, que cuida de pessoas pobres portadores do vírus da AIDS. Esses títulos só podiam ser comercializados se parte dos valores arrecadados fossem para uma instituição de caridade. Mas o Lar da Esperança não recebeu até hoje o montante que lhe cabia, cerca de R$ 1,8 milhão durante todo o tempo de atuação do título na capital. O Piauí Cap foi fundado em 10 de maio de 2011 e passou a doar dinheiro à instituição há três anos. Os piauienses, ao comprarem as cartelas vendidas nas ruas pelo preço de R$ 5,00, eram informados, inclusive, através da TV, que parte do dinheiro seria revertido para instituições de caridade. Mas o Lar da Esperança nunca recebeu a quantia integral. O valor repassado era minguado e abaixo do estabelecido. Ao longo desse tempo foram doados somente R$ 72 mil através do Instituto Ativa Brasil, o equivalente a R$ 2 mil por mês. Bem aquém do montante a que tinha direito.
O Instituto Ativa Brasil, segundo as investigações, fazia parte do esquema. Ele está localizado no bairro Barroca, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Era para ser uma entidade sem fins lucrativos e está em atuação desde 2 de fevereiro de 2006. O instituto de fachada era quem pagava uma empresa de publicidade, que também pertencia à família Paschoal, para fazer a publicidade dos prêmios e dos supostos títulos de capitalização.
Os documentos de posse do 180 também evidenciam que a última compra realizada pelo instituto foi no valor de R$ 30.100,00, no dia 5 de novembro de 2014, antes da operação da PF. A maior fatura foi de R$ 240.800,00 e o maior negócio R$ 1.055.686,00.
MPF NO PIAUÍ JÁ HAVIA MOVIDO AÇÃO CONTRA OS PASCHOAL
O Ministério Público Federal do Piauí já havia ingressado com uma ação civil pública contra os sócios da família Paschoal, movida em 2012, através do procurador da República Kelston Pinheiro Lages. A ação foi baseada em expediente instaurado na Procuradoria da República, através do inquérito civil nº 1.27.000.001804/2011-98, após notícia jornalística da atuação irregular das empresas e de seus sócios.
Figuraram como polo passivo na ação, além dos quatro donos do Piauí Cap, a empresa Sul América Seguros S. A – Sulacap, a Associação Universidade Ativa e a Promobem Piauí Distribuição e Serviço de Promoção de Vendas LTDA, a Piauí Cap.
Christiano Rocco Carneiro e os sócios da família Paschoal operavam o esquema
A Sul América era a empresa responsável pela emissão dos títulos de capitalização. Pelo regulamento do Piauí Cap, o cliente “adquire o título e cede no ato da aquisição, 100% do direito de resgate do título ao Instituto Ativa Brasil”. Em seu despacho, o juiz Lucas Araújo chegou a destacar trechos do relatório e de um parecer da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) – autarquia do governo federal responsável por editar as regras desse tipo de atividade.
“O conteúdo desses documentos aponta que a sistemática adotada na emissão e na comercialização do “Piauí Cap” acarreta ao menos duas situações desfavoráveis ao consumidor: i) inobservância do prazo de vigência mínimo de 12 meses; e ii) ausência de opção pelo resgate do valor investido no título de capitalização”.
“Concretamente o “Piauí Cap” não observa essa regra, pois, conforme a fiscalização da SUSEP, o título sob comentário é estruturado, na prática, com vigência inferior a doze meses, uma vez que a série emitida é integralmente resgatada antecipadamente no último dia do mês seguinte ao da comercialização”, sustentou o magistrado.
Era uma atuação suspeita por parte daqueles proprietários de carros de luxo. Porque esse procedimento dava ao comprador somente direito de participar dos sorteios, não permitia a capitalização dos recursos aplicados pelo titular, já que os prazos não eram respeitados.
Os investigados podem responder pela prática dos crimes de contrabando, crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, jogos de azar e lavagem de dinheiro. Somadas, as penas ultrapassam o limite de 30 anos.
A ação dos proprietários do Piauí Cap foi tema neste domingo (23) de uma ampla e detalhada matéria veiculada no jornalístico Fantástico, da Rede Globo.
0 comentários:
Postar um comentário